segunda-feira, abril 24, 2006

Suave e lentamente, sem perturbar o delírio os corpos amantes que se dedicavam mutua e exclusivamente, o banco elevou-se nos ares ganhando altitude. Quando estancou encontrava-se frente aos dois Arco-iris, e começou a avançar na sua direcção. Os seus passageiros encontravam-se agora na plenitude da adolescência, e avidamente procuravam descobrir novas formas de beijar. "Tão bom ter-te aqui, comigo", exclamava Carolina, enquanto intercalava cada palavra com um ósculo ardente. Quando interromperam novamente a troca de carinhos voltaram a reparar nos Arco-Iris, no banco que os tinha suspensos na atmosfera, no mundo vazio de tudo debaixo deles. Tudo estava tão diferente e simples, mas por muito bizarra que fosse aquela situação encaravam-na com a normalidade de quem sempre nela viveu.

De repente o banco começou a girar, e o mundo começou a girar em sentido oposto. Os Arco-iris esticaram-se, esticando as suas pontas até estas se encontrarem, transformando-se em duas faixas contínuas, duas auto-estradas paralelas de sete cores, sem principio, sem fim, concêntricas àquele banco. Somente aqueles dois corpos se mantinham inalteráveis, alheios ao reboliço que os rodeava, ignorando a anarquia que os envolvia. Com uma cadência cada vez maior tudo rodava. Mundo, banco, sete cores, chão, mais sete cores, as nuvens, o sol, o céu. Aqueles dois corações continuavam a bater, fortes, dando forças aos corpos que começavam começavam a dançar cadenciados ao mesmo ritmo. "O tempo corre cada vez mais rapido, e dentro em pouco seremos só um." uma voz que era uma mistura das duas vozes. "Sim, mas sinto que já o somos..." respondeu a mesma voz. Alheios ao frenesim de movimentos que os rodeavam, os dois amantes ultimavam os preparativos para grande momento que sentiam se aproximar. O tempo corria, o mundo corria, o banco voava livre, os Arco-irís dançavam em espiral, mas naquelas duas almas apenas uma alma existia, e essa alma era o unico plano de existência de tão grande amor. As mão começavam a ter rugas, as tremuras apareceram, primeiro a ela, depois a ele. "Gosto de Ti" disse a voz unica. E o carinho de um beijo sem luxuria ou sensualidade, carregando anos de dedicada felicidade floriu num dos rostos, enquanto o outro se abriu num sorriso.

O banco hesitava em avançar rumo ao infinto, esperando pelo momento certo, o momento exacto em que aqueles dois corpos finalmente se encontrassem prontos para se entregar um ao outro incondicionalmente. Quando esse momento chegou novamente o assento onde se encontravam voltou a ganhar momento, e dirigiu-se para a escapatória daquela realidade abstracta. Atravessou os Arco-Irís, penetrou na montanha nublosa e saiu encarando uma noite estrelada. Uma faixa de luzes, umas mais brilhantes, outras mais difusas os receberam. Como a poeira dos caminhantes também eles se transformaram em parte do firmamento, mais uma constelação a guiar os viajantes pelo caminho de Santiago.

Sem comentários: